quinta-feira, 8 de abril de 2010

Perto das nuvens, no íntimo de Alice!




Ela simplesmente amarrou a flor amarela, doce e singela cheia de formosura no cabelo liso ruivo vermelho, enferrujado pelo queimar do sol, e deitou-se na grama verde com seus colares e pulseiras coloridas para sentir o vento, a grama, os insetos, a sombra, o azul, o verde, o marrom e o negro.

Não se importou com as pedrinhas que tentavam penetrar suas costelas. Não se importou com o barulho que mastigava seus ouvidos das crianças que corriam perto da pontezinha. Não se importou com as nuvens que se aproximavam e pintavam o céu de negro. Ela simplesmente se deu conta de que aquele momento era só dela. Do seu íntimo. Do seu eu. Do seu me. Do seu consigo.

As pedrinhas reforçaram a idéia de que tudo aquilo não era um devaneio porque ainda podia sentir seu corpo sendo perturbado, mas não se concentrou nesse desconforto. O barulho que mastigava seus ouvidos apenas estava ali como música cantada por gritos de alegria que ela só poderia cantar na infância, mas não ficou nostálgica por essa lembrança. As nuvens que se aproximavam para pintar o céu não a deixaram encabulada, apenas se lembrou dos momentos que ela trouxe com seus amigos, amores, amantes. Nada naquele momento poderia tirar a atenção dos seus olhos que estavam cravados dentro do seu corpo.

Então, continuou com os olhos vendados pela brisa calma que arrastava as folhas secas do pé de laranja. Conseguiu sentir o cheiro doce das frutas ao seu redor. Conseguiu sentir o odor dos animálculos que insistem brincar com o algodão da sua blusa branca com estampa da sua banda preferida. Conseguiu ver de olhos fechados as bolinhas de gude que os meninos brincavam na terra ainda seca e a boneca com vestido triste da menina azeda de olhos atentos. Conseguiu sentir todas as folhinhas do verde que roçavam sua pele branca pintada de ouro na luz solar.

No seu íntimo, viu os abraços, os beijos, os carinhos, as paixões, os amores, e simplesmente viu que não foi tudo em vão.Viu que o rio de lágrimas tristes e felizes que passou por ela quando estava sentada na pedra com águas nos olhos não foi simplesmente passando. Ele levou os fantasmas que ainda estavam sendo exorcizados da sua casa nada assombrada e deixava, agora, os quadros mais belos que ela artista faceira pôde pintar com as cores mais contentes do contentamento.

Uma euforia penetrava, ou não sei se já estava dentro do seu ser, em seus dedos do pé e subiam como luz brilhante e que fazia cócegas por suas pernas, entre suas pernas e agora estava entre seus seios, mais próximo ao coração, eu diria. Era como se essa luz massageasse suas tensões por ter andado todos os quilômetros na rua dos sentimentos.

E essa luz quis subir para sua mente, para seus pensamentos, para seu ainda mais abstrato. E se aconchegou no cantinho mais escondido do seu corpo. Ela varreu as dores que sentia na nuca por falta de dedos para fazer-lhe um cafuné. Tocou as memórias dos seus tempos de menina de uma forma sedutora no embalo da valsa que a brisa deixava os galhos de laranjeira tocar. Brincou com os desejos mais picantes que sua mente devassa pôde fabricar na caixa máquina de pensar.

Ela riu. Houve riso por causa das cócegas. A luz também riu junto. E quiseram dividir desse momento que , até então, era só de uma. Foi aí que ela abriu as asas longas de pássaro que tinha. E voou. Voou junto a brisa, junto as folhas secas, junto ao aroma das laranjas até chegar na nuvens que se formava no cinza. E isso não impediu de voar. Ela abriu os olhos e viu que estavam todos sorrindo para ela como se percebessem sua alegria inocente e surreal. Os meninos com as bolinhas de gude. A menina azeda de olhos atentos. O inseto pequeno que caminhou pelo seu busto. Tudo foi um sorriso só.

Ao sentir aquela harmonia de sentimentos tão diferentes na sua bochecha, ela quis gritar para o mundo o seu riso na boca rosada. Levantou a cabeça, sentiu a maciez das nuvens e simplesmente explodiu o feliz que se fazia nas suas cordas vocais, nas suas pernas e asas, na sua barriga que perdera o frio pelo medo que foi embora da altura dos seus sonhos.

Na boca aberta sentiu o doce ácido viciante das águas dos céus. Uma gota bateu-lhe nos dentes e escorreu para seu paladar. Foi um doce tão doce que se confundiu com o cheiro das frutas que estavam na sua língua. Seu sorriso ficou ainda maior a ponto de querer sair do rosto e tomar vida própria.

Ela calmamente gritava suas gargalhadas felizes. Um prazer inocente corroia de contente suas faces. Adiante, ela quis dançar na chuva com sua saia longa rodada hippie e seus pé no chão, no ar. Ela quis se maquiar de azul. Ela quis gritar. Ela quis confessar para o mundo seu poder de ser feliz naquele momento único do seu livro de poesias pouco contemplado. Quis gritar na cara dos seus amores o quanto ela estava bem consigo mesma, por mais que se estranhasse essa condição. Quis abraçar seu menino, sua menina. Quis beijar seu homem, sua mulher. Quis dizer o quanto estava feliz por ter tido os dois na sua vida, mesmo que no instante não os tenha. Quis agarrar as cartas que mandaram-lhe, por mais que nos instante ela se tornara analfabeta para o amor. Quis barofar o algodão doce das nuvens no rosto dos seus belos sentimentos guardados para o seu e para a sua. Quis avisar para seus amantes que tudo estava tão bem e que a idéia de necessidade dos seus amores não lhe passava pela cabeça. Quis amar apenas a idéia de estar bem na chuva, voando e vendo sorrisos que voltavam para o seu tão belo.

Nas nuvens, na chuva, no vento, no doce, no cheiro, no amor, na paixão, no contente, no só, no consigo. Com seus colares e pulseiras coloridas e sua saia longa rodada de hippie. Com sua flor amarela, doce e singela cheia de formosura no cabelo liso ruivo vermelho, enferrujado pelo queimar do sol, Alice dançava no seu íntimo contente por não querer amar naquele instante.

Júnior!

Um comentário: